Data: 19/08/2019
Todos nós já tivemos a desagradável experiência de comer uma bolacha que estava fora da embalagem por algum tempo. Apesar de o sabor permanecer o mesmo, aquela crocância tão característica do produto já se perdeu e a experiência de consumo deste produto não é mais a mesma.
Muitas pessoas acreditam que o sabor é a principal, e muitas vezes única, característica que definirá a aceitação ou não de um alimento.
Isto pode ser verdade em muitos casos. Mas nem sempre é assim.
É só pensarmos nas diferentes sensações que experimentamos ao consumir, por exemplo, uma batata chips, um nugget de frango, um purê ou um sorvete, para concluirmos o quão importante é a textura dos produtos.
A reologia, um ramo da ciência que estuda as deformações e escoamentos da matéria, encontra sua aplicação no ramo dos alimentos no que diz respeito à textura dos mesmos. As características reológicas de um produto ditarão aspectos como viscosidade, consistência e elasticidade.
Neste blog post, entenderemos como a textura de um produto pode afetar a sua aceitação junto aos consumidores, aprofundaremos as características de textura mais importantes e descobriremos o que fazer para garantir a presença das mesmas nos alimentos.
A ciência por trás da textura dos alimentos
Para entender o quão importante é a textura para o reconhecimento de um alimento, pesquisadores conduziram um experimento no qual alteraram a textura de uma variedade de produtos, sem mudar o sabor dos mesmos.
De todos os participantes que provaram os alimentos com a textura alterada, apenas 40,7% conseguiu acertar qual era o alimento baseando-se apenas no sabor.
Dessa forma os pesquisadores concluíram que a textura é um fator fundamental para a aceitação de um produto alimentício.
Os estudos em relação à textura dos alimentos ajudam, inclusive, na formulação dos mesmos e em decisões de processo. Já foi detectado, por exemplo, que cristais de gelo que medem 40 mícrons ou mais, são perceptíveis ao paladar humano.
Portanto, na fabricação do sorvete, é sempre preferível que o processo de congelamento seja realizado de forma rápida, para se evitar o crescimento de cristais que excedam este tamanho limite, mantendo-se, dessa forma, a textura aveludada e macia, característica deste tipo de produto.
Esta textura do sorvete também é acarretada pelo seu teor de gordura, que além disso, também contribui para um sabor encorpado e para um derretimento mais uniforme, fazendo com que a reologia do sorvete seja marcante e única.
Além disso, a textura de um alimento terá uma grande influência sobre o seu sabor. Alimentos mais consistentes tendem a ter um sabor menos pronunciado que aqueles mais macios e úmidos.
A acidez dos gummy bears, por exemplo, só é tolerável ao paladar humano devido à sua textura resistente, o que permite uma liberação gradual do sabor. Em contrapartida, os sanduíches costumam sempre conter algum molho, que será responsável por carrear os sabores presentes no produto, promovendo uma característica sensorial mais completa.
A relação dos consumidores com a textura
A forma como o consumidor se relaciona com a textura de um produto também difere de acordo com cada público-alvo. Os adultos, por exemplo, preferem texturas mais complexas, o que explica o sucesso de produtos como barras de chocolate adicionadas de nozes, algo não tão popular entre crianças.
Além disso, os consumidores podem ser categorizados de acordo com suas preferências em relação à textura dos alimentos.
De acordo com os pesquisadores do The Understanding & Insight Group , dos EUA e da Nova Zelândia, os consumidores podem ser divididos em:
- Chewers: aqueles que preferem mastigar os alimentos por um tempo prolongado, como acontece com chicletes e gummy bears.
- Suckers : os que preferem alimentos mais duros que dissolvem na boca ao longo do tempo, como as balas.
- Smooshers: os amantes de alimentos macios e cremosos que não requerem muito esforço para mastigar, como purê de batata e pudim.
- Crunchers: aqueles que não resistem aos alimentos crocantes, que produzem um som característico ao serem mastigados. Este é o caso dos chips e de empanados, como nuggets de frango.
Por sinal, este último grupo é numeroso e engloba a maior parte dos consumidores. Para entender este fenômeno, precisamos responder à pergunta:
Por que gostamos tanto de alimentos crocantes?
A crocância é associada pelos consumidores a alimentos mais frescos e de melhor qualidade. Além disso, os mesmos também consideram este tipo de produto atraente e prazeroso.
Os sons produzidos pelo mastigamento de alimentos crocantes modulam a percepção das pessoas sobre características como umidade, textura e sabor.
Em painéis de análise sensorial, inclusive, os consumidores geralmente usam o termo “sonoridade” para julgar a intensidade da crocância.
Apesar de universalmente adorada, a crocância pode ser definida de formas diferentes, dependendo da percepção dos consumidores.
Em Nova York, por exemplo, uma pesquisa detectou que as pessoas definem um alimento crocante como aquele que é firme, rígido, que se rompe facilmente quando deformado e que produz um som característico quando consumido.
Já no Uruguai e na Espanha, foram citados termos como “som característico” ou “duro, resistente, sólido” para descrever alimentos crocantes, sendo que as respostas diferiram dependendo do país.
Uma definição universal proposta nos diz que alimentos crocantes são aqueles “de textura densa que, quando mastigados com os dentes molares, sofre uma série de fraturas que emitem sons relativamente altos e de baixa frequência”.
Já em relação ao alimento em si, o óleo usado para a fritura terá uma influência direta na crocância do produto. A crocância da batata frita, por exemplo, é positivamente correlacionada com o tempo de fritura. Além disso, a absorção do óleo pelo produto aumenta à medida que a umidade do mesmo é perdida.
Além disso, os óleos e as gorduras para fritura precisam possuir um sabor neutro e não conter after taste. A função desses ingredientes no produto são, além de intensificar o sabor do alimento, melhorar a textura, conferindo a tão desejada crocância.
Com a preocupação com a saúde cada vez mais frequente entre a população, a melhor forma de manter a textura adequada dos alimentos fritos afetando ao mínimo a saúde é utilizando-se gorduras com zero teor de ácidos graxos trans e/ou baixo teor de ácidos graxos saturados.
Produtos empanados: a combinação entre crocância e sabor
Os produtos empanados são extremamente populares, em especial produtos cárneos derivados de aves, como steaks e nuggets de frango, por exemplo. Essa popularidade se dá, em parte, a uma textura inconfundível, marcada pela crocância.
Para produzir um empanado de qualidade, porém, é preciso estar atento à escolha da farinha de empanamento.
A farinha tradicional, também conhecida como cracker, possui apenas farinha e água em sua formulação, apresentando grãos densos e textura firme. É uma alternativa mais econômica, adequada para fritura por imersão.
Já a farinha estilo americano é arredondada com pedaços de crostas, se parecendo com a farinha de rosca caseira. Confere ao produto uma aparência premium, possuindo partículas densas e resistentes ao processamento. Este tipo de farinha possui boa performance em quase todos os tipos de produtos.
Por último, a farinha estilo japonês possui forma alongada e é livre de crostas. Sua textura e aparência lhe conferem boa utilização tanto para produtos fritos quanto para assados.
Avaliando a textura dos alimentos
Entendida a importância da textura dos alimentos, é preciso conhecer as formas de se avaliar esta característica na indústria alimentícia.
O primeiro passo é saber o que os consumidores esperam da textura de um determinado alimento. Esta informação pode ser obtida por meio de pesquisas de opinião e questionários.
Partindo desse ponto, após o desenvolvimento do alimento, dois tipos de testes podem ser conduzidos. O primeiro deles é a análise sensorial, onde potenciais consumidores ou um painel treinado provará o produto e avaliará a textura do mesmo. Este método é mais subjetivo e, devido a isso, pode apresentar grandes variações nos resultados.
Outra forma de avaliação seria o uso de análises instrumentais, onde por meio de equipamentos de alta tecnologia, as variáveis que compõem a textura de um produto são avaliadas.
O ideal é que ambos métodos sejam utilizados em conjuntos e tenham seus dados correlacionados para gerar um resultado mais completo e confiável para a empresa.
Conclusão
Assim como o sabor e o aroma, a textura também é um fator essencial na aceitação de um produto alimentício.
Conhecer os padrões reológicos dos alimentos, assim como definir métodos para analisá-los pode ter uma grande participação no sucesso de uma nova formulação.
Dentre as características de textura mais relevantes no setor alimentício, a crocância se destaca, podendo ser alcançada por meio de processos de fritura adequados e também através do desenvolvimento de produtos empanados. Para isso, é necessário se atentar para a qualidade dos ingredientes escolhidos e para a adequação dos mesmos ao tipo de textura que se deseja alcançar.