Data: 30/05/2022

Os animais de produção necessitam consumir uma nutrição balanceada para que atinjam os níveis de desenvolvimento adequados. A ração ou nutrição é a parte mais cara do cultivo, sendo responsável por aproximadamente 70% dos custos operacionais, sendo a proteína a fração que apresenta o maior valor em uma ração, com estudos indicando que 33,3% desse custo é da proteína.

Proteínas, quimicamente, são condensações aminoacídicas através das ligações peptídicas. Quando um alimento que contém esse componente é consumido, são hidrolisados no sistema digestório em peptídeos e aminoácidos livres, que, por sua vez, são absorvidos pelo organismo e metabolizados para formar novos tipos de proteínas nos diferentes tecidos corporais como músculos e proteínas funcionais, por exemplo, as enzimas. Os aminoácidos, são subdivididos em aminoácidos não essenciais e essenciais, esse último tem que ser suprido por meio da dieta.

Por ser um componente de extrema importância na elaboração de rações, zootecnistas e/ou responsáveis pelas formulações de nutrição animal buscam ingredientes que apresentam elevado teor de proteína e que a mesma tenha balanceamento apropriado de aminoácidos a um menor custo. Com essas condições, apresenta-se um terreno fértil para os departamentos de pesquisa e desenvolvimento apresentarem soluções de novas fontes proteicas que atendam as necessidades mencionadas. Uma nutrição equilibrada proporciona um crescimento adequado e saudável aos animais de produção, assim o uso de ingredientes de alta qualidade irá garantir que o animal cultivado consiga manter sua higidez mesmo com os desafios e estresse inerentes de uma produção animal intensiva.

O uso de novas fontes proteicas como as proteínas hidrolisadas, permitem a um animal de produção ter o seu máximo desempenho zootécnico, e também apresentam funcionalidades específicas, como: atividade antioxidante, antimicrobiana, antifúngicos, antivirais e antiparasitários.

A agroindústria brasileira é geradora de diversas fontes proteicas, como, por exemplo, empresas esmagadoras de soja, que são fornecedoras de proteínas derivadas do farelo de soja. Por outro lado, frigoríficos fornecem proteínas derivadas do processamento de carcaças e/ou vísceras provenientes do abate de animais. Nas próximas seções, serão discutidas novas fontes de proteínas, que apresentam alta disponibilidade e digestibilidade de seus aminoácidos.

Proteínas de fonte vegetal

Há diversas fontes vegetais de proteínas e as principais são: farelos de soja, girassol, canola, trigo e outras.

Normalmente, as proteínas vegetais são caracterizadas por desbalanço de aminoácidos e altos níveis de fatores antinutricionais, como polissacarídeos não-amiláceos indigeríveis, ácido fítico, taninos e alcalóides, os quais afetam o uso desse nutriente em formulações de nutrição animal. Para contornar tal situação, são utilizadas técnicas capazes de liberar essas proteínas e desativar os fatores antinutricionais, como desativação de soja (inibidores de tripsina) e uso de fitases para desativação de fitatos.

Pela grande difusão, neste primeiro artigo, vamos discorrer sobre a soja e alguns subprodutos.

Soja

A soja (Glycine max (L.) Merr.) é uma das leguminosas (grãos contidos em vagem) mais importantes do mundo, sendo que a America representa aproximadamente 80% da produção mundial, e o Brasil é responsável por 50% do comércio mundial dessa leguminosa.

A soja tem elevada produção por ser rica em proteínas de alta qualidade, com o adicional de ter óleo comestível. Esses derivados têm elevado valor nutricional com características sensoriais agradáveis. Devido a esses benefícios mencionados anteriormente, os derivados são muito utilizados como ingredientes de rações.

A fonte de proteína vegetal mais utilizada no mundo é a soja e, em virtude disso, existem muitas pesquisas em desenvolvimento referentes a essa importante matéria prima. Um dos vários produtos elaborados a partir dessa leguminosa é o Concentrado de Proteína de Soja (CPS), sendo comercializado desde os anos 1950, e utilizado, principalmente, para obter uma alta concentração de proteínas (mínimo 70%) nos produtos destinados à nutrição animal, com um aditivo de não apresentar componentes antinutricionais.

Os derivados de soja apresentam características importantes na produção de nutrição animal, por exemplo:

  • Disposição espacial de seus peptídeos propiciam interações intermoleculares com outras proteínas e componentes da matriz alimentar, melhorando a gelatinização e formação de pastas;
  • Apresentar propriedades hidrofílicas possibilitando solubilidade, adesividade e viscosidade adequada aos produtos.

Farelo de soja

Um dos derivados de soja mais importantes para a nutrição animal é o farelo de soja. A produção desse derivado deve-se à necessidade da extração do óleo de soja, sendo que até meados dos anos 1930 ele não era utilizado extensivamente pelos zootecnistas/nutricionistas. No entanto, com o passar dos anos, inúmeras pesquisas foram realizadas em animais de produção (suínos, bovinos, aves, etc.) para mostrar o potencial desse valioso ingrediente.

Atualmente, as pesquisas referentes a esse ingrediente estão voltadas para:

  • Digestibilidade de aminoácidos;
  • Fatores antinutricionais;
  • Energia metabolizável e energia líquida.

Quando comparado com outras fontes vegetais de proteínas, o farelo de soja demonstra ter uma menor variabilidade de nutrientes e concentrações menores de fatores antinutricionais.

Geralmente, é comercializado em diversas concentrações de proteína bruta, variando de 40% até 48%, sendo que essa concentração é acertada pela inclusão de outros subprodutos, como a casquinha de soja.

Proteínas de origem animal

As proteínas de origem animal, presentes em farinhas, são derivadas do processamento de material de frigoríficos que seriam descartados e não podem ser comercializadas para o consumo humano. As fontes de proteína animal mais utilizadas na nutrição estão dispostas abaixo:

Farinha de carne e ossos

Este tipo de farinha é produzida em graxarias independentes ou em frigoríficos, sendo composta basicamente de ossos e tecidos animais provenientes do abate de bovinos, suínos e ovinos. É um ingrediente fonte de proteína e minerais importantes como cálcio e fósforo.

A Farinha de Carne e Ossos apresenta elevada variação em sua composição por não existir padrão na relação ossos e tecidos cárneos. A quantidade de proteínas é inversamente proporcional ao teor de minerais, ou seja, elevado teor de mineral acarreta baixo teor de proteína. Normalmente, é comercializada em termos de sua concentração de proteína bruta, sendo: 35, 40, 45 e 55%.

Farinha Hidrolisada de Penas

A depenagem das aves nos abatedouros resulta em um subproduto que apresenta um elevado teor de proteínas e esse subproduto, ao sofrer o processo de cocção sob pressão, é chamado de Farinha Hidrolisada de Penas, contendo de 78 a 92% de proteína bruta, constituída de 85 a 95% de queratina.

Segundo Nascimento et al. (2002), essa matéria-prima não se apresenta com digestibilidade satisfatória, sendo atribuída essa característica às ligações de hidrogênio e interações hidrofóbicas intramoleculares na molécula de queratina. Para melhoria na digestibilidade, esse ingrediente pode passar por processos enzimáticos, liberando os peptídeos e tornando-se um ingrediente de melhor qualidade.

Farinha de Vísceras de Frango

Segundo Padilha 2005, no processamento de frango são gerados coprodutos, tais como cabeças, vísceras, sangue, gordura, pele, ossos e carcaças desclassificadas. Esses são transformados em Farinha de Vísceras.

A Farinha de Vísceras de Frango é um ingrediente de elevado teor proteico, apresentando proteína bruta com variação de 55 a 70%, dependendo da concentração de ossos nos componentes inclusos no processo de cocção.

A digestibilidade dessa proteína sofre interferência em seus valores pelo processo de produção (cocção) e pelos outros insumos inclusos no processo, os quais apresentam digestibilidade diferente.

Em relação a esse ingrediente, estão em constante desenvolvimento metodologias, como a hidrólise, capazes de aprimorar a digestibilidade desse ingrediente e garantir o desempenho de rações produzidas com ele.

Tendências de uso de proteínas processadas em rações animais

Para que ocorra um aprimoramento das rações, é fundamental a escolha por ingredientes de excelente qualidade. Nesse sentido, pesquisas estão sendo realizadas para descobrir novos processos, tal como a hidrólise enzimática que produz peptídeos funcionais, com o objetivo de extrair o máximo desempenho dos componentes e gerar novos ingredientes.

Desse modo, com novas tecnologias empregadas no processamento de alimentos e a exploração de fontes alternativas de proteína, alguns novos ingredientes surgem como opção para suprir as necessidades nutricionais e funcionais dos animais .Na sequência, são colocadas em destaque algumas alternativas.

Peptídeos funcionais

A definição de peptídeos é que esses são sequências curtas de proteínas alimentares, compostas, principalmente, de 2 à 20 resíduos de aminoácidos condensados numa molécula, obtidos através de processos de digestão e/ou fermentação das proteínas íntegras.

Esses peptídeos apresentam efeitos fisiológicos positivos, mostrando que são ingredientes funcionais ou moléculas bioativase possuem uma variedade de alvos, como sistemas imunológicos, cardiovasculares, digestivos e endócrinos, e, com isso, a melhora do desempenho dos animais.

Embora ainda haja um longo caminho a ser percorrido para entender os mecanismos de ação desses peptídeos funcionais nos organismos, o que já foi estudado retrata que existe um grande benefício ao organismo que consome essas moléculas de forma regular. Sendo assim, o zootecnista e/ou profissional responsável pelas formulações deve incentivar a inclusão desses ingredientes em suas formulações.

Proteína Hidrolisada de Frango

Os coprodutos do abate de frangos, como vísceras e miúdos de baixo valor comercial, passam pelo processo enzimático que libera aminoácidos e peptídeos de baixo peso molecular. Esses, por sua vez, são de fácil absorção quando os ingredientes são empregados na nutrição animal. De acordo com dos Santos Cardoso, et al 202020, esse ingrediente possui um elevado teor proteico (acima de 75%) , apresenta um perfil aminoacídico balanceado e uma alta palatabilidade para tilápia do Nilo. Sendo assim, esse ingrediente quando empregado na nutrição animal melhora o desempenho zootécnico dos peixes.

A Proteína Hidrolisada de Frango (PHF) é uma proteína funcional formulada especialmente para melhorar a performance de rações animais. Ela é produzida através de um processo de hidrólise enzimática que gera cadeias menores de peptídeos bioativos e aminoácidos, ou seja, criando um ingrediente funcional com alto valor biológico e alta digestibilidade. A PHF oferece como benefícios para os animais, a alta digestibilidade, alta atratividade e palatabilidade e o elevado teor proteico com perfil equilibrado de aminoácidos.

Na análise do perfil dos aminoácidos encontrados nos organismos, tecidos e células (HERRERO et al., 2008) foram encontrados 78 peptídeos bioativos na Proteína Hidrolisa de de Frango, sendo os principais identificados os peptideos Anti-amninéstico, Antioxidante, Antitrombótico, Inibidor de Angiotensina (ACE), Inibidor de Dipeptil Peptidase IV (DPP IV), Regulador, Inibidor de Secreção da Insulina, Neuropeptídeo, Quimioestático, Regulador da Membrana do Estômago. Regulador do Metabolismo do Fosfoinositol e Imunoestimulante. De modo geral, a PHF é um ingrediente fonte de peptídeos bioativos, que melhora o metabolismo e saúde dos animais, além de ser uma fonte hipoalergênica.

Hidrolisado Enzimático de Penas

A Farinha de Penas convencional não apresenta digestibilidade satisfatória, devido às ligações de hidrogênio e interações hidrofóbicas intramoleculares nas moléculas de proteína. Para solucionar esse problema, é realizado um processo proteolítico que quebra as ligações peptídicas, independentemente do tamanho da cadeia peptídica da queratina.

Por ser produzido de penas, esse ingrediente apresenta um elevadíssimo teor protéico (acima de 75%), apresentando a excelente característica de ter em sua composição aminoácidos essenciais, com destaque para a leucina, fenilalanina e triptofano.

Por ser produzido de penas, esse ingrediente apresenta um elevadíssimo teor protéico (acima de 75%), apresentando a excelente característica de ter em sua composição aminoácidos essenciais, com destaque para a leucina, fenilalanina e triptofano.

Farinha de insetos

Alguns estudos afirmam que as farinhas de insetos apresentam um grande potencial na nutrição animal, tornando-se tendência nesse ramo da indústria de rações animais. A farinha de insetos (Tenebrio molitor) apresenta aproximadamente cerca de 45 a 65% de proteína,sendo uma excelente fonte de proteína, tendo um perfil adequado de aminoácidos.

Algumas pesquisas demonstraram a viabilidade da substituição total ou parcial das fontes proteicas tradicionais pela farinha de insetos na alimentação de aves e suínos. Muitos autores descrevem as taxas de crescimento semelhantes ou melhores quando comparados com farelo de soja, farinha integral de peixe ou sua combinação. A digestibilidade dos nutrientes pode ser otimizada quando combinadas em uma formulação com farinha de peixe e farinha de insetos.

Outras fontes alternativas

Algumas alternativas ao uso do farelo de soja como principal fonte proteica já estão sendo testadas, na nutrição de suínos. Algumas fontes vegetais alternativas já demonstraram capacidade de substituir cerca de 50 a 75% da proteína advinda do farelo de soja, como são os casos dos farelos de algodão, de desengordurado de arroz e de girassol, além de sementes de algumas leguminosas como o guandú.

As leveduras, apesar de serem utilizadas como um aditivo alimentar, são microrganismos proteicos alternativos para nutrição animal e o seu uso como um enriquecimento da ração é uma tendência positiva nesse mercado. A necessidade de uma utilização do subproduto da indústria alcooleira estimulou inúmeras pesquisas em que descobriu-se que estes microrganismos apresentam potencial nutricional e nutraceútico, passando a ser pesquisados e incorporados na alimentação animal.

Um outro alimento alternativo que já demonstrou excelentes resultados é o pólen apícola, que apresenta entre 10 e 40% de sua composição de proteínas, sendo um alimento extremamente rico em aminoácidos essenciais, resultando em ótimos resultados produtivos em estudos para frangos de corte, desempenho de tilápias e desempenho reprodutivo de coelhos, entre outros.

Conclusão

A nutrição animal tem, todos os dias, em seu escopo de matérias primas novas fontes de proteínas, derivadas de estudos conduzidos por equipes de pesquisas e desenvolvimento, trazendo a combinação entre uma composição nutricional equilibrada e excelentes propriedades funcionais.

O uso da hidrólise enzimática para a obtenção de hidrolisados proteicos ricos em peptídeos bioativos e balanceamento adequado de aminoácidos, é um processo em plena ascensão. As proteínas hidrolisadas de coprodutos de abate animal são alternativas de fonte proteica funcional de alto valor biológico por ser uma excelente fonte de peptídeos bioativos, melhorando o desempenho, a saúde e o bem estar dos animais.